23 de fevereiro de 2010

GENTE QUE FAZ FALTA: Olímpia da Luz


Estive revirando algumas fotos antigas destas que eternizam o tempo na nossa memória. A foto é uma imagem icônica e que, por isso, retrata fielmente a realidade. Folheie um velho álbum de fotografias lá na casa da dona Olinda e paralisei o olhar cheio de saudade no retrato daquela que foi e sempre será uma grande pessoa, um grande exemplo, uma grande mulher: Olímpia da Luz. Na foto, ela segura carinhosamente a sua filha Andréia quando ainda era uma menininha, creio eu, com menos de três anos. O olhar fitado de mãe da querida professora me comove. Olhar de leoa ao proteger o filhote do perigo. Sorriso de mãe orgulhosa que ergue o filho como um troféu. Não pude mais passar aquela folha do pequeno álbum cheirando a mofo depois de ter olhado pra ela e eu pensei já triste: “O tempo foi cruel conosco quando resolveu retirá-la de nós”. A Olímpia foi um exemplo: perseverante, cheia de garra e dona de um sorriso marcante. Audaciosa e moderna demais pro seu tempo, ela sofreu duras criticas, foi motivo de muitas fofocas porque ousou ser independente numa época em que mulher obrigatoriamente dependia do marido e isso chocou um 47 absolutamente machista. Recusou-se a ficar em casa fazendo crochê e ousou, mesmo com filhos pequenos, se separar do pai de suas crias e isso foi visto com maus olhos pelo povo da cidade. Corajosa, audaciosa...mulher. O que dizer dela? O que lembrar de uma jovem tão revolucionária filha de uma cidade que condenava à fogueira os hereges de seu tempo? Professora, mãe, esposa... guerreira. Sinto pena dos que não a conheceram e dó dos que não conseguiram a perdoá-la ou ainda compreendê-la, pois foi mulher, na mais valorosa acepção dessa palavra. Pecou em ser mãe, talvez, por ter repartido o tempo dos filhos com o trabalho, a política e as causas sociais. Brigou por causas próprias, causas alheias. Não importava de quem eram as causas, pois lutou por todas. Há uma frase da Simone, sua sobrinha e amiga, que conseguiu traduzir quem ela era: “A titia não tinha uma causa própria, diferente dos políticos com os quais convivia, a causa dela era a dos outros”.
Eu sei bem de sua causa e lembro bem da época em que a prefeitura resolveu tirar as árvores da avenida Castelo Branco, umas castanholeiras lindas, pomposas e coposas que nasceram ali às margens da Br e já faziam parte da paisagem da cidade desde a época em que ainda pertencíamos ao município de Ourém. Eu era uma criança muito pequena mas a cena marcou as minhas lembranças e ainda está viva na minha memória. A patrol da prefeitura chegando pra retirar as árvores com raízes e tudo seguras e puxadas por um cabo de aço. As árvores, o meio ambiente, eram a bandeira que ela levantou em sala de aula aquele dia pra mobilizar os seus alunos. Dezenas de meninos uniformizados foram às ruas pedir pelo não derrubamento das árvores centenárias. Mas aqueles estudantes não foram capazes de barrar a fúria das máquinas e a professora, lembro perfeitamente, subiu num dos vegetais esse mostrou mulher de personalidade forte: “Arranquem a árvore daqui e me levem junto, só assim me tiram desse lugar”. Foi bonito de ver, foi excelente presenciar seu ato de coragem, parecia que estávamos num filme de Chico Mendes. Naquela época, a prefeitura de Ourém desistiu da investida mas depois que a vila virou cidade, o prefeito Juraci tirou o verde de lá sem que alguém pudesse impedir.
Hoje,a ausência das árvores é a ausência dela também. 14 anos se passaram após a sua morte e a nós cabe boas lembranças dessa mulher forte, brilhante, batalhadora e guerreira chamada Olímpia da Luz, a professora que um trágico acidente automotivo tirou de nós, os expectadores de suas loucuras, de sua coragem, de sua astúcia. Olímpia Lucena, a mãe do Andrey, do Miguelzinho e da Andréia que, sem ela, pareciam, durante anos, ter perdido o rumo que, hoje, a vida, o tempo os fez reencontrar. Esteja em paz professora. Saudades eternas!

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